ORIENTAÇÃO TÉCNICO-JURÍDICA 02/2020 CENTRO DE APOIO OPERACIONAL
ORIENTAÇÃO TÉCNICO-JURÍDICA 02/2020 CENTRO DE APOIO OPERACIONAL
ÁREA DE ATUAÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E TERCEIRO SETOR
CONTRATOS DE CREDENCIAMENTO PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NA ÁREA DE SAÚDE
A ÁREA DE ATUAÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO E TERCEIRO SETOR DO CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO
DO ESTADO DE GOIÁS, visando auxiliar os órgãos de execução, elaborou a presente orientação técnico-jurídica, SEM CARÁTER VINCULATIVO, sobre a legalidade das contratações de profissionais na área de saúde, em âmbito municipal, por meio de credenciamento, em detrimento de concurso público, a partir do regramento constitucional e legal, bem como do entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre o tema, com sugestões de atuação diante do caso concreto, por meio de roteiros de atuação e modelos de peças para a deflagração de investigações.
PARTICIPAÇÃO DE SERVIÇOS PRIVADOS PARA COMPLEMENTAÇÃO DO ATENDIMENTO NA ÁREA DA SAÚDE PÚBLICA
A instituição do Sistema Único de Saúde pela Constituição Federal de 1988 representou um marco para as políticas públicas de saúde no país. A saúde está entre os direitos sociais previstos expressamente nos arts. 6º e 196, da CF/88, e foi definida como um direito de todos e um dever do Estado, que deve garanti-la por meio de políticas sociais e econômicas. Isso porque, sendo
os direitos sociais compreendidos como prestacionais, demandam do Estado, em suas três esferas (União, Estados e Municípios), atuação positiva no sentido de sua proteção, respeito e promoção. Nesses termos, constitui a saúde verdadeiro direito subjetivo da população.
A organização do SUS está assentada em três pilares: rede (integração dos serviços interfederativos), regionalização (região de saúde) e hierarquização (níveis de complexidade dos serviços). Esses são os pilares que sustentam o modelo de atenção à saúde, conforme dispõe o art. 198 da CF/88.
Destarte, as três esferas de governo são responsáveis conjuntamente por garantir o direito à saúde, mas a descentralização das ações, principalmente para o âmbito municipal, foi consagrada como um dos princípios mais importantes do SUS, estabelecendo a CF/88, em seu art. 30, bem como a Lei nº 8.080/90, que trata da organização dos serviços de saúde, que aos Municípios compete prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população.
A participação da iniciativa privada no âmbito do SUS também está prevista na Constituição Federal, que expressamente dispõe acerca da complementaridade dessa atuação, sempre observando as diretrizes do SUS e reservando preferência para entidades filantrópicas e sem fins lucrativos, in verbis:
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
§ 1º As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos. (Grifou-se).
A possibilidade de complementação proveniente da iniciativa privada é destacada também pela Lei nº 8.080/90, ao estabelecer:
Art. 4º O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS).
§ 1º Estão incluídas no disposto neste artigo as instituições públicas federais, estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para saúde.
§ 2º A iniciativa privada poderá participar do Sistema Único de Saúde (SUS), em caráter complementar.
Art. 8º As ações e serviços de saúde, executados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), seja diretamente ou mediante participação complementar da iniciativa privada, serão organizados de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente.
Art. 24. Quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o Sistema Único de Saúde (SUS) poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada.
Parágrafo único. A participação complementar dos serviços privados será formalizada mediante contrato ou convênio, observadas, a respeito, as normas de direito público.
Como se vê, a complementaridade autorizada pelo constituinte originário e disiciplinada pela Lei 8.080/90, não confere um poder amplo ao gestor, de contratar ou transferir a prestação de serviços de saúde, no âmbito do SUS, à iniciativa privada. Ao contrário, a CF e a Lei 8.080/90 condicionam a participação da iniciativa privada na prestação de serviços de saúde no SUS à insuficiência de disponibilidade para a cobertura assistencial à população.
Nesse mesmo rumo, a Portaria de Consolidação nº 1, de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde, Título VI, Capítulo I, artigo 130, estabelece critérios quanto à participação complementar das instituições privadas de assistência à saúde no âmbito do SUS, fixando a necessidade de prévia comprovação da insuficiência da rede pública e a impossibilidade de ampliação dos serviços próprios como condição para contratar serviços da iniciativa privada:
Art. 130. Nas hipóteses em que a oferta de ações e serviços de saúde públicos próprios forem insuficientes e comprovada a impossibilidade de ampliação para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinado território, o gestor competente poderá recorrer aos serviços de saúde ofertados pela iniciativa privada. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º)
§ 1º Na complementação dos serviços de saúde deverão ser observados os princípios e as diretrizes do SUS e as normas técnicas e administrativas aplicáveis. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 1º)
§ 2º Assegurada a preferência às entidades filantrópicas e sem fins lucrativos e ainda persistindo a necessidade quantitativa dos serviços demandados, o ente público recorrerá às entidades com fins lucrativos. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 2º)
§ 3º A participação complementar das instituições privadas de assistência à saúde no SUS será formalizada mediante a celebração de contrato ou convênio com o ente público, observando-se os termos da Lei nº 8.666, de 1993, e da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, de acordo com os seguintes critérios: (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º,
§ 3º)
I - convênio: firmado entre ente público e a instituição privada sem fins lucrativos, quando houver interesse comum em firmar parceria em prol da prestação de serviços assistenciais à saúde; e (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 3º, I)
II - contrato administrativo: firmado entre ente público e instituições privadas com ou sem fins lucrativos, quando o objeto do contrato for a compra de serviços de saúde. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 3º, II)
§ 4º As entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos deixarão de ter preferência na contratação com o SUS, e concorrerão em igualdade de condições com as entidades privadas lucrativas, no respectivo processo de licitação, caso não cumpram os requisitos fixados na legislação vigente. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 4º)
§ 5º As entidades filantrópicas e sem fins lucrativos deverão satisfazer, para a celebração de instrumento com a esfera de governo interessada, os requisitos básicos contidos na Lei nº 8.666, de 1993, e no art. 3º da Lei nº 12.101, independentemente das condições técnicas, operacionais e outros requisitos ou exigências fixadas pelos gestores do SUS. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 5º)
§ 6º Para efeito de remuneração, os serviços contratados deverão utilizar como referência a Tabela de Procedimentos do SUS. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 6º)
É dizer: a atuação complementar da iniciativa privada no SUS somente será legítima se houver insuficiência da rede pública e impossibilidade de ampliação dos serviços próprios pelo ente público. Se a insuficiência da rede der-se em razão da negligência ou recusa do ente público em adequar sua estrutura à demanda existente, a complementação pela iniciativa privada será inconstitucional e poderá, inclusive, conduzir à responsabilização do gestor recalcitrante.
Entretanto, devidamente comprovada a insuficiência da rede e a impossibilidade de ampliação dos serviços próprios, a complementação dos serviços de saúde pela iniciativa privada encontrará amparo constitucional. E constitui, sem dúvida, hipótese excepcional e constitucionalmente autorizada de realização de atividade-fim da Administração Pública, pela iniciativa privada.
A necessidade de complementação da prestação dos serviços de saúde por meio da iniciativa privada tem sido uma realidade em muitos Municípios. O SUS enfrenta diversos obstáculos para contratar médicos e outros
profissionais de saúde. De outro lado, pouco tem sido o interesse dos gestores públicos na ampliação da rede de atendimento, em razão dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF - às despesas com pessoal. Diante desse quadro, a opção pelo credenciamento de profissionais de saúde tem sido a alternativa dos gestores municipais para atender a demanda crescente de serviços de saúde, embora em desacordo com a CF e com a LRF.
Importante salientar, entretanto, que em nenhum momento o texto constitucional autoriza a transferência da prestação do serviço público de saúde à iniciativa privada. O que faz a Carta Magna é autorizar uma atuação complementar, com o intuito de ampliar a rede, para o atendimento da demanda que o ente estatal não suporte, por ter esgotado sua capacidade e por não ter condições de ampliar essa capacidade.
Necessário pontuar que o esgotamento da capacidade do ente público de prestar, diretamente, o serviço de saúde passa pela análise, não somente, da capacidade instalada de atendimento, como da demanda permanente sobressalente e da possibilidade de ampliação da rede de atendimento. A alternativa de complementação da rede pela iniciativa privada somente se legitimará se a capacidade instalada do ente publico for insuficiente e não for possível a ele ampliar a rede de atendimento. Dessa forma, impositivo que o ente público adote as providências necessárias para incrementar sua rede e, assim, ofertar o serviço diretamente. Somente em hipóteses excepcionais, em que se revele, realmente, impossível o incremento da rede própria para o atendimento de demanda permanente, é que a alternativa da complementação pela iniciativa privada revela-se compatível com a Constituição Federal.
Apesar disso, os Municípios têm optado pela figura do credenciamento, à prestação direta dos serviços por profissionais recrutados por concurso público, precarizando os vínculos dos seus quadros de pessoal na área de saúde, não como opções refletidas de gestão ou política administrativa, mas, em essência, apenas como fuga ao que estabelece a CF e a LRF, a qual impõe limites para gastos com pessoal.
CREDENCIAMENTO NA ÁREA DA SAÚDE PÚBLICA
I - Da inexigibilidade de licitação
Como explanado acima, os serviços de saúde prestados ao cidadão diretamente pela União, Estados e Municípios integram a atividade-fim da Administração Pública e são caracterizados pela continuidade e tecnicidade, portanto, devem ser, em regra, prestados por servidores efetivos, admitidos por concurso público (art. 37, II, CF).
Entretanto, diversos Municípios têm abdicado do dever constitucional de prestar diretamente os serviços de saúde, por meio do sucateamento da rede própria ou simplesmente deixando de prover os cargos públicos existentes na estrutura própria por meio de concurso público e optando por contratar tais serviços de forma precária, seja por contratação temporária, seja por contrato de credenciamento.
Todavia, a contratação temporária só pode ser admitida para atender a necessidade temporária e de excepcional interesse público (art. 37, IX, CF). Dessa forma, afasta-se da finalidade constitucional as contratações precárias e temporárias de profissionais para os serviços rotineiros de saúde,
para o atendimento de demanda permanente, não excepcional, com renovações sucessivas. A contratação temporária pode ser tolerada em hipóteses restritas, como na ocorrência de uma epidemia de saúde ou para suprir a falta de servidores enquanto não se conclui um concurso público, por exemplo.
Por outro lado, o credenciamento é um contrato administrativo celebrado por inexigibilidade de licitação (art. 25, caput, Lei nº 8666/93), para atuação não-exclusiva, sem competição entre os possíveis contratados, com o fim de complementar os serviços públicos de saúde (arts. 197 e 199, § 1º, CF), nas situações em que os serviços de saúde da rede pública forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial necessária e não puder o ente público ampliar os serviços da rede.
Reitera-se que o credenciamento não se destina à substituição de pessoal do quadro próprio do ente público, mas à complementação dos serviços prestados diretamente, nas restritas situações autorizadas pela CF.
A doutrina caracteriza o credenciamento como uma hipótese de contratação direta, por inexigibilidade de licitação. Xxxxxx Xxxxx, esclarecendo a natureza jurídica do credenciamento, pontifica:
Nas hipóteses em que não se verifica a excludência (sic) entre as contratações públicas, a solução será o credenciamento.
[…] O credenciamento envolve uma espécie de cadastro de prestadores de serviço ou fornecedores. O credenciamento é o ato pelo qual o sujeito obtém a inscrição de seu nome no referido cadastro. É necessário destacar que o cadastro para credenciamento deve estar permanentemente aberto a futuros interessados, ainda que seja possível estabelecer certos limites temporais para contratações concretas.
[…] Como não há limitação ou exclusão, não há necessidade de licitar.
[…] Nas situações de ausência de competição, em que o credenciamento é adequado, a Administração não precisa realizar licitação. Sob certo ângulo, verifica-se a inexigibilidade de licitação, por inviabilidade de competição. Na verdade, a inviabilidade de competição consiste, no caso, na ausência de excludência (sic) entre os possíveis interessados. (XXXXXX XXXXX, Xxxxxx. Filho. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 12. ed., São Paulo: Dialética, 2008, p. 46-
47) (grifou-se).
Na mesma linha, é o ensinamento de Xxxxxxxxx, o qual orienta que devem ser observados os aspectos fundamentais ou requisitos que definem a possibilidade de uso ou não, do que ele chama “pré-qualificação do tipo credenciamento”, in verbis:
[…] há quatro aspectos fundamentais que definem a possibilidade de uso ou não da pré-qualificação do tipo credenciamento:
a) possibilidade de contratação de todos os que satisfaçam às condições exigidas;
b) impessoalidade na definição da demanda, por contratado;
c) que o objeto satisfaça na forma definida no edital;
d) que o preço de mercado seja razoavelmente uniforme. (XXXXXXXXX, Xxxxx Xxxxxxx Xxxxxx. Vade- Mecum de licitações e contratos. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 784-787). (Grifou-se).
Ainda valendo dos ensinamentos de Xxxxxxxxx:
Se a Administração convoca todos os profissionais de determinado setor, dispondo-se a contratar todos os que tiveram interesse e que satisfaçam os requisitos estabelecidos, ela própria fixando o valor que se dispõe a pagar, os possíveis licitantes não competirão, no estrito sentido da palavra, inviabilizando a competição, uma vez que a todos foi assegurada a contratação. É a figura do "credenciamento", que o Tribunal de Contas da União vem recomendando para a contratação de "serviços médicos", jurídicos e de treinamento.(XXXXXXXXX, Xxxxx
Xxxxxxx Xxxxxx. Contratação direta sem licitação. 9. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011).
Tal entendimento é também sufragado pelo Tribunal de Contas da
União:
Ante o previsto no caput do art. 25 da Lei n. 8.666/93, de 21/06/93, e por exigir um grau de subjetividade bastante razoável, com referência à fixação dos critérios para julgamento da licitação, caso viesse a ser implementada pelos motivos aventados, propomos, por tudo isso, o credenciamento, com inexigibilidade de processo licitatório, uma vez que a norma legal dá ensejo ao abrigo de tal propositura, dada a impossibilidade prática de estabelecer-se o confronto entre licitantes, no mesmo nível de igualdade (Processo n. TC — 008.797/93-5, sessão: 09/12/2003. TCU) (Grifou-se).
O credenciamento é hipótese de inviabilidade de competição não expressamente mencionada no art. 25 da Lei 8.666/1993 (cujos incisos são meramente exemplificativos). Adota-se o credenciamento quando a Administração tem por objetivo dispor da maior rede possível de prestadores de serviços. Nessa situação, a inviabilidade de competição não decorre da ausência de possibilidade de competição, mas sim da ausência de interesse da Administração em restringir o número de contratados. (Acórdão 3567/2014-Plenário TCU, Revisor: Xxxxxxxx Xxxxxx) (Grifou-se).
O credenciamento pode ser considerado como hipótese de inviabilidade de competição quando observados requisitos como: i) contratação de todos os que tiverem interesse e que satisfaçam as condições fixadas pela Administração, não havendo relação de exclusão; ii) garantia de igualdade de condições entre todos os interessados hábeis a contratar com a Administração, pelo preço por ela definido; iii) demonstração inequívoca de que as necessidades da Administração somente poderão ser atendidas dessa forma. (Acórdão 2504/2017-Primeira Câmara TCU, Relator: Xxxxxxx Xxxxxxx) (Grifou-se).
É possível a utilização de credenciamento - hipótese de inviabilidade de competição não relacionada expressamente no art. 25 da Lei 8.666/1993 - para contratar prestação de serviços privados de saúde no
âmbito do SUS, que tem como peculiaridades preço pré- fixado, diversidade de procedimentos e demanda superior à capacidade de oferta pelo Poder Público, quando há o interesse da Administração em contratar todos os prestadores de serviços que atendam aos requisitos do edital de chamamento. (Xxxxxxx 784/2018-Plenário TCU, Relator: Xxxxxx Xxxxxxxxx) (Grifou-se).
Observa-se, portanto, que o instituto do credenciamento visa à contratação de todos aqueles que preencham os requisitos determinados em edital. Não há que falar em ordem de preferência sob justificativa alguma. Qualquer empresa que cumpra as exigências editalícias e que aceite o valor predeterminado deve ser contratada pela Administração. Caso contrário, não será própria a utilização do credenciamento (Denúncia
n. 751.882, Primeira Câmara, sessão: 18/09/08, TCE/MG).
II - Da Instrução Normativa nº 007/2016 do TCM/GO
O Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás, visando a orientar os municípios goianos sobre o credenciamento de prestadores de serviços na área de saúde, editou a Instrução Normativa nº 007/16.
Reverberando o que estabelece a CF e a Lei 8.080/90, a IN 007/2016 estabelece, em seu artigo 2º, parágrafo único:
Art. 2º. Para a prestação dos serviços públicos de saúde e a implementação dos programas e ações descentralizadas de saúde, segundo a disciplina da Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (Lei nº 8.080/90), impõem-se à Administração Pública, como regra, a criação de cargos públicos de caráter efetivo no quadro de pessoal permanente e o provimento por meio de concurso público.
Parágrafo único. Considerando o caráter finalístico e a titularidade dos serviços públicos de saúde, o
credenciamento não se destina à substituição do quadro de pessoal próprio, mas à complementação dos serviços prestados diretamente.
A disposição regulamentar é clara ao dispor que, nos casos de prestação de serviço público de saúde, o credenciamento não se destina à substituição ou composição do quadro de pessoal próprio do ente público, mas à complementação dos serviços prestados diretamente, de modo que se impõe à Administração Pública, como regra, a criação de cargos públicos de caráter efetivo no quadro permanente de pessoal e o provimento de tais cargos por meio de concurso público.
Já em seu artigo 3º, a IN 007/2016 conceitua esse modelo de contratação como um contrato administrativo, celebrado por inexigibilidade de licitação, para atuação não exclusiva de todos os interessados que atendam às condições estabelecidas no edital:
Art. 3°. Considera-se credenciamento o contrato administrativo celebrado diretamente por inexigibilidade de licitação para atuação não-exclusiva, sem competição, precedido de chamamento público aberto a todos os interessados que atendam as condições estabelecidas em edital, com vistas a contratação de profissional saúde ou pessoa jurídica para a prestação complementar de serviços públicos de saúde a população, utilizando-se de estrutura e recursos próprios ou da Administração Pública e tendo em contrapartida a remuneração por procedimento ou unidade de serviço.
§ 1º. A inexistência de competitividade pressupõe contratação que não exclua outros profissionais ou entidades, como ocorre quando há vagas limitadas.
§ 2º. A escolha, dentre os credenciados, daquele que prestará o serviço compete ao próprio usuário do serviço público municipal de saúde.
§ 3°. Nas localidades em que, comprovadamente, não for possível o provimento, em caráter efetivo, de cargos
públicos de profissionais da saúde, pode ser excepcionalmente utilizado o credenciamento para o exercício de atividades em vagas limitadas, como no caso de profissionais plantonistas ou sujeitos a uma carga horaria específica, desde que o número de profissionais ou entidades interessadas seja menor ou igual ao número de vagas ofertadas, observadas as demais disposições desta Instrução e a legislação aplicável. (Grifou-se).
Na mesma linha, a Portaria de Consolidação nº 1 de de 28 de setembro de 2017, do Ministério da Saúde, Título VI, Capítulo I, artigo 128 inciso II, define o credenciamento da seguinte forma:
Art. 129. […]
II - credenciamento: procedimento de licitação por meio do qual a administração pública, após chamamento público para um determinado objeto, celebra contrato de prestação de serviços com todos aqueles considerados aptos, nos termos do art. 25, "caput" da Lei nº 8.666, de 1993; (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 2º, II)
Necessário pontuar que o § 3º, do art. 3º, da IN nº 007/2016, admite a possibilidade de contratação por credenciamento de profissionais de saúde para a substituição de servidores, naquelas excepcionais hipóteses de incapacidade do ente público de prover os cargos públicos integrantes da sua estrutura própria. Mesmo nessas situações, a contratação por credenciamento, somente será legítima se não houver possibilidade de exclusão de interessados. Atente-se que o TCM condiciona a legitimidade da contratação por credenciamento, nessa hipótese, a existência de número menor de interessados do que o número de vagas ofertadas, porquanto somente assim não resultará desnaturado o credenciamento.
Nessa linha de intelecção, afigura-se inconstitucional que o Poder Público valha-se de contratos de credenciamento de profissionais de saúde para escapar ao mandamento do concurso público (AC-COM N. 04/2013 – Câmara de Palminópolis – TCM/GO).
III – Da celebração dos contratos de credenciamento
Segundo o Ministério da Saúde, em seu “Manual de Orientações para a Contratação de Serviços de Saúde”, o credenciamento de prestadores de serviços de saúde deverá obedecer às seguintes etapas:
• chamamento público com a publicação do regulamento (edital);
• inscrição;
• cadastro (Certificado de Registro Cadastral - CRC) das entidades privadas interessadas;
• habilitação;
• assinatura do termo contratual;
• publicação do extrato do contrato no Diário Oficial do ente contratante ou jornal local de grande circulação.
O Tribunal de Contas da União, em auditoria, cujo relatório foi apreciado pelo Acórdão nº 352/2016, apontou as seguintes diretrizes na celebração de ajustes com entidades privadas visando à prestação de serviços de saúde:
Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Relatório de Auditoria consolidando Fiscalização de Orientação Centralizada, que teve como objetivo avaliar a regularidade dos ajustes firmados pelos governos municipais e estaduais com entidades privadas para terceirização de profissionais de saúde com recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS), ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos
em sessão do Plenário, ante os motivos expostos pelo Relator, em:
9.1. determinar ao Ministério da Saúde com fulcro no art. 250, inciso II, do Regimento Interno do Tribunal de Contas da União, que oriente todos os entes federativos a observarem as seguintes diretrizes na celebração de ajustes com entidades privadas visando a prestação de serviços de saúde:
9.1.1. a contratação de entidades para disponibilização de profissionais de saúde deve ser precedida de estudos que demonstrem as suas vantagens em relação à contratação direta pelo ente público, com inclusão de planilha detalhada com a estimativa de custos a serem incorridos na execução dos ajustes, além de consulta ao respectivo Conselho de Saúde;
9.1.2. o credenciamento pode ser utilizado para a contratação de profissionais de saúde para atuarem tanto em unidades públicas de saúde quanto em seus próprios consultórios e clínicas, sendo o instrumento adequado a ser usado quando se verifica a inviabilidade de competição para preenchimento das vagas, bem como quando a demanda pelos serviços é superior à oferta e é possível a contratação de todos os interessados, sendo necessário o desenvolvimento de metodologia para a distribuição dos serviços entre os interessados de forma objetiva e impessoal;
9.1.3. devem ser realizados estudos que indiquem qual sistema de remuneração dos serviços prestados é mais adequado para o caso específico do objeto do ajuste a ser celebrado, levando em consideração que a escolha da forma de pagamento por tempo, por procedimentos, por caso, por capitação ou a combinação de diferentes métodos de remuneração possui impacto direto no volume e na qualidade dos serviços prestados à população;
9.1.4. os processos de pagamento das entidades contratadas devem estar suportados por documentos que comprovem que os serviços foram efetivamente prestados – demonstrando o controle da frequência dos profissionais, os procedimentos realizados, os pacientes atendidos – e que garantam que os impostos, taxas e encargos trabalhistas aplicáveis ao caso foram devidamente recolhidos;
9.1.5. não há amparo legal na contratação de mão de obra por entidade interposta mediante a celebração de termos de compromisso com Oscip ou de instrumentos congêneres, tais como convênios, termos de cooperação ou termos de fomento, firmados com entidades sem fins lucrativos. (ACÓRDÃO
352/2016 – PLENÁRIO. Relator: XXXXXXXX XXXXXX)
(Grifou-se).
Como se verifica, é imprescindível ao credenciamento a etapa de chamamento público, para que os aspectos como a lisura, a transparência, a economicidade do procedimento e o tratamento isonômico dos interessados sejam garantidos. Além disso, também devem permear as contratações os princípios e as diretrizes do SUS.
É mister que a Administração Pública estabeleça de forma clara os critérios e as exigências mínimas para que os interessados possam credenciar- se, com o intuito de garantir que aqueles que vierem a ser credenciados, tenham condições reais de prestar um bom atendimento, atingindo o interesse público não apenas da oferta do serviço, mas de que esse serviço tenha qualidade compatível com as necessidades da população.
A respeito da formalização do contrato, vale salientar que ela deve acontecer por instrumento contratual que estabeleça, de forma clara e objetiva, os direitos e deveres de cada uma das partes. A importância dos referidos instrumentos contratuais revela-se não apenas como forma de estabelecimento de compromisso entre as partes, como também de gestão, controle e avaliação dos serviços contratados, epecialmente durante a execução contratual.
Ressalta-se que o TCU entende como inadequada a utilização do instrumento jurídico convênio para o credenciamento de entidades para a prestação de serviços de saúde em caráter complementar. A utilização de convênios ou instrumentos semelhantes, tais como termos de colaboração e de
fomento, pressupõe a existência de interesses recíprocos entre concedente e convenente, sem que exista a previsão de lucro por uma das partes ou a prestação de um serviço mediante pagamento pela outra parte. Assim, a contratação de profissionais médicos mediante esses ajustes é considerada, pela Corte, inadequada, pois deve seguir o devido procedimento licitatório.
4.2.3. Convênio ou instrumentos congêneres celebrados com entidades sem fins lucrativos
285. Os convênios são um instrumento a ser utilizado quando o poder público deseja realizar cooperação com entidades sem fins lucrativos para a busca de um objetivo comum. Segundo o §1º do art. 1º do Decreto 6.170/2007:
I - convênio - acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento que discipline a transferência de recursos financeiros de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da
União e tenha como partícipe, de um lado, órgão ou entidade da administração pública federal, direta ou indireta, e, de outro lado, órgão ou entidade da administração pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, ou ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando a execução de programa de governo, envolvendo a realização de projeto, atividade, serviço, aquisição de bens ou evento de interesse recíproco, em regime de mútua cooperação.
286. Porém, a Lei 13.019/2014 instituiu o termo de colaboração e o termo de fomento, instrumentos que substituirão os convênios na relação do poder público com as organizações da sociedade civil a partir de 1º/8/2015, quando a Lei entrar em vigor.
287. O convênio, assim como o termo de fomento e o termo de cooperação, são instrumentos com natureza semelhante ao termo de parceria, tanto que as disposições da Lei 13.019/2014 também serão aplicáveis às relações da administração pública com as Oscips, conforme determina o art. 4º da norma. O objetivo destes instrumentos é a celebração de parceria com entidades privadas sem fins lucrativos, em que o Estado irá promover o fomento de atividades de interesse social.
288. Por conseguinte, assim como não condiz com a natureza das Oscips a intermediação de mão de obra para Estado, também não devem ser utilizados convênios, termos de cooperação ou termos de fomento para esta mesma finalidade.
289. Na presente fiscalização, o município de Candelária, v.g., celebrou convênio com a Adeccan, que inclusive possui a qualificação de Oscip, para intermediação de mão de obra em diversas áreas. (Xxxxxxx 352/2016-TCU- Plenário, TC 017.783/2014-3) (Grifou-se).
Nesse sentido é também a disciplinada Portaria de Consolidação nº 1 de 23 de setembro de 2017, a qual define, em seu artigo 129:
Artigo 129. […] […]
VIII - convênio: instrumento firmado entre ente público e a instituição privada sem fins lucrativos, quando houver interesse comum em firmar parceria em prol da prestação de serviços assistenciais à saúde; (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 2º, VIII)
IX - contrato: ajuste entre órgãos ou entidades de saúde da Administração Pública e particulares, em que há um acordo de vontade para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, atinentes à prestação de serviços do SUS; (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 2º, IX)
E ainda, o artigo 130 da Portaria de
Consolidação 1, estabelece:
Art. 130. […]
[...]
§ 3º A participação complementar das instituições privadas de assistência à saúde no SUS será formalizada mediante a celebração de contrato ou convênio com o ente público, observando-se os termos da Lei nº 8.666, de 1993, e da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, de acordo com os seguintes critérios: (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º,
§ 3º)
I - convênio: firmado entre ente público e a instituição privada sem fins lucrativos, quando houver interesse comum em firmar parceria em prol da prestação de serviços assistenciais à saúde; e (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 3º, I)
II - contrato administrativo: firmado entre ente público e instituições privadas com ou sem fins lucrativos, quando o objeto do contrato for a compra de serviços de saúde. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 3º, § 3º, II)
A natureza e objetivos do credenciamento não se compatibiliza com a natureza do convênio, mas amolda-se à figura do contrato, porquanto há a formação de um vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, atinentes a prestação dos serviços do SUS.
Acerca da remuneração dos credenciados, esta acontece na forma de contrapartida, por procedimento ou unidade de serviço, conforme estabelecido em edital e no contrato. Em princípio, os valores deverão atender aos parâmetros fixados pelo SUS, conforme estabelece a Portaria de Consolidação nº 1, em seu artigo 129, § 6º. Entretanto, é possível que o Município estabeleça preços acima dos mínimos, tendo em conta características locais e o objetivo de atrair um número maior de profissionais, conforme entendimento do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, na Consulta nº 811.980, Relator Conselheiro Xxxxxxx Xxxxxx Xxxxxxx. Contudo, a fixação da remuneração deverá observar os princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, levando-se em conta as circunstâncias locais e as disponibilidades financeiras.
Nessa hipótese, recomenda-se, a fim de preservar a segurança jurídica e a transparência, a regulamentação da matéria pelo Chefe do Executivo municipal, com prévia discussão e aprovação pelo Conselho Municipal de Saúde, ressalvando que essa complementação de valores deverá ser suportada por recursos próprios do tesouro municipal, vedada sua utilização pelos rubricados, repassados fundo a fundo, para o SUS.
É o que estabelece a Portaria de Consolidação 6 de 28 de setembro de 2017:
Art. 1140. Os Estados, Distrito Federal e Municípios que adotarem tabela diferenciada para remuneração de serviços assistenciais de saúde deverão, para efeito de complementação financeira, empregar recursos próprios estaduais e/ou municipais, sendo vedada a utilização de recursos federais para esta finalidade. (Origem: PRT MS/GM 1606/2001, Art. 1º)
Art. 1141. A utilização de tabela diferenciada para remuneração de serviços de saúde não poderá acarretar, sob nenhuma circunstância, em discriminação no acesso ou no atendimento dos usuários referenciados por outros municípios ou estados no processo de Programação Pactuada Integrada (PPI). (Origem: PRT MS/GM 1606/2001, Art. 2º)
Parágrafo Único. Para evitar a que o Tesouro Municipal seja onerado pelos serviços prestados a cidadãos de outros municípios, os gestores municipais que decidirem por complementar os valores da tabela nacional de procedimentos deverão buscar, em articulação com os gestores dos municípios que utilizem sua rede assistencial, a implementação de mecanismos de cooperação para a provisão dos serviços. (Origem: PRT MS/GM 1606/2001, Art. 2º, Parágrafo Único)
Ademais, é preciso que sejam verificados os limites impostos pela Constituição Federal como teto remuneratório do Município, vinculados ao subsídio percebido pelo Prefeito, além dos limites estabelecidos na LRF para as despesas com pessoal, uma vez que tais despesas, quando decorrentes de contratos celebrados em substituição1 de servidores ou empregados públicos, como se verá adiante, deverão ser contabilizadas como despesas de pessoal, nos termos do que estabelece o artigo 18, § 1º, da LRF.
Em relação à comprovação da prestação dos serviços, destaca- se que é indispensável constar nos contratos de credenciamento regras claras acerca dos documentos e outras evidências que demonstrem a efetividade da prestação dos serviços, na qualidade e quantidade contratadas, como condição para a efetivação dos pagamentos correspondentes.
É de suma importância o estabelecimento, por parte da Administração Pública, de reavaliação periódica, bem como da previsão contratual de hipóteses de descredenciamento daqueles que não estejam cumprindo as regras e condições fixadas para o atendimento, de denúncia do ajuste, a qualquer tempo, pelo credenciado e, até mesmo de participação dos usuários, com a possibilidade de apresentação de denúncias sobre irregularidades.
Nessa reavaliação, devem ser analisados aspectos inerentes aos parâmetros de qualificação dos prestadores de serviço, do quantitativo de credenciados e da própria opção pelo credenciamento, no caso, se ela permanece necessária e viável. Para tanto, faz-se indispensável o acompanhamento dos resultados alcançados, em termos não apenas de eficácia, mas também de efetividade dos serviços, além da avaliação acerca da possibilidade de o Município ampliar a sua rede própria.
Destaca-se, ademais, que a orientação do Ministério da Saúde é que o registro de dados cadastrais para credenciamento deve estar permanentemente aberto a futuros interessados, estabelecidos limites temporais para as contratações, sem prejuízo de que o Poder Público proceda a novo chamamento público, periodicamente, para a atualização dos registros
existentes e para possibilitar o ingresso de novos interessados, utilizando-se da imprensa oficial.
Outro aspecto inerente ao credenciamento e bastante relevante é o fato de que, em geral, deve caber ao usuário a escolha do profissional a quem deseja recorrer. A escolha não deve, em regra, ficar a cargo da Administração Pública. Realizado o procedimento de inexigibilidade e estando credenciados os prestadores de serviço, será o cidadão que selecionará, dentre os credenciados, aquele que, no momento, melhor atende à sua necessidade ou conveniência. Essa escolha pode ser feita com base em diversos critérios, a exemplo do critério da localização.
Entretanto, importante ressalva deve ser feita para a situação de atendimentos de média e alta complexidade. Para procedimentos emergenciais, procedimentos cirúrgicos, ou mesmo especializados, por exemplo, não há como a escolha ficar a cargo do usuário do serviço. Assim, é necessário que a Administração Pública estabeleça uma forma de seleção do prestador de serviço de modo que, mesmo nesses casos, seja garantido o tratamento isonômico entre os credenciados.
IV - Da documentação para formalização do instrumento contratual de credenciamento
Conforme Manual de Orientações para Contratação de Serviços de Saúde do Ministério da Saúde, que estabelece diretrizes para atuação dos gestores, a regra da licitação é válida para toda e qualquer contratação:
A licitação é uma exigência constitucional, prevista no art. 37, XXI, da CF e na Lei nº. 8.666/93. Consiste em
estabelece:
procedimento administrativo formal, em que a Administração Pública convoca, por meio de edital ou aviso, interessados em apresentar propostas para contratação de prestação de serviços de saúde, e se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório. Não é sigilosa, é pública e acessível aos cidadãos. (BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de Orientações para Contratação de Serviços de Saúde. 1.ed. Brasília: 2016) (Grifou-se).
A Portaria de Consolidação nº 1 de 23 de setembro de 2017, assim
Art. 132. A contratação complementar dos prestadores de serviços de saúde se dará nos termos da Lei nº 8.666, de 1993. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 5º)
§ 1º Desde que justificado pelo gestor competente, será admitido o credenciamento formal das entidades privadas nas hipóteses em que houver necessidade de um maior número de prestadores para o mesmo objeto e a competição entre eles for inviável. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art. 5º, § 1º)
§ 2º No caso do § 1º, serão aplicadas as regras da inexigibilidade de licitação, nos termos do art. 25, "caput", da Leiº 8.666, de 1993. (Origem: PRT MS/GM 2567/2016, Art.
5º, § 2º)
Dentre os requisitos elencados pela Lei nº 8.666/93, estão os citados no artigo 27:
Art. 27. Para a habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados, exclusivamente, documentação relativa a:
I - habilitação jurídica; II - qualificação técnica;
III - qualificação econômico-financeira; IV – regularidade fiscal e trabalhista;
V – cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.(Grifou-se).
Segundo o artigo 55 da Lei nº 8.666/93, é necessário que todos os contratos de credenciamento firmados contenham as seguintes cláusulas necessárias, as quais devem ser destacadas já no ato convocatório e cuja ausência pode resultar na nulidade do contrato:
1. objeto: conterá as especificações, inclusive quanto à quantidade a ser contratada, de forma clara e sucinta;
2. regime de execução dos serviços: discriminando, por exemplo, a espécie de internação, incluindo UTI, a assistência exigida, o tipo de acomodação das consultas, dos exames, das terapias, dos casos de urgência e emergência, das internações eletivas, e outras situações pertinentes aos serviços contratados, os critérios de avaliação e controle, a gratuidade dos serviços, a proibição de cobrança de valores complementares, dos acréscimos e/ou supressões de serviços contratados até os limites fixados em lei;
3. previsão do preço e suas condições de pagamento, os critérios desse pagamento, a data base e a periodicidade do reajuste de preços, os critérios de atualização monetária entre a data do adimplemento das obrigações e a do efetivo pagamento;
4. previsão dos prazos de início e final da prestação de serviços;
5. crédito pelo qual correrá a despesa, com a sua classificação funcional programática e da categoria econômica;
6. previsão das obrigações e das responsabilidades das partes, as penalidades cabíveis e os valores de multas;
7. casos de rescisão;
8. reconhecimento dos direitos da Administração, em caso de rescisão administrativa (no caso de inexecução total ou parcial do contrato);
9. vinculação ao Edital de Chamada Pública;
10. legislação aplicável à execução do contrato, especialmente aos casos omissos;
11. obrigação do contratado de manter, durante toda execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na Chamada Pública.
Oportuno informar que existem cláusulas contratuais que o
Ministério da Saúde entende como recomendáveis:
Ainda que não constantes no rol das necessárias, são cláusulas que visam otimizar a relação contratual, explicitando o objeto, tratando da qualidade e do desempenho das atividades de interesse público. Para tanto deverão observar as condições exigidas para os serviços de saúde, atendendo as normas do Ministério da
Saúde e das Secretarias de Saúde dos Estados, Distrito Federal e Municípios, no que couber. (BRASIL. Ministério da Saúde. Manual de Orientações para Contratação de Serviços de Saúde. 1.ed. Brasília: 2016).
Nos contratos de prestação de serviços de assistência à saúde, celebrados com entidades filantrópicas, privadas sem fins lucrativos, com fins lucrativos e organizações sociais, o Estado e o Município deverão estabelecer, além das cláusulas necessárias de que trata a legislação pertinente, outras decorrentes da especificidade das ações de assistência a saúde, bem como da sua relevância pública e das políticas e diretrizes do Ministério da Saúde, conforme estabelecido na Portaria de Consolidação nº 1, de 23 de setembro de 2017, artigo s128 a 139, que dispõem sobre a participação complementar das instituições privadas com ou sem fins lucrativos de assistência à saúde, no âmbito do SUS.
DA CONTABILIZAÇÃO COMO DESPESA DE PESSOAL DOS VALORES PAGOS EM RAZÃO DA CONTRATAÇÃO POR CREDENCIAMENTO
A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece, em seu artigo 18, §
1º:
Art. 18. Para os efeitos desta Lei Complementar, entende- se como despesa total com pessoal: o somatório dos gastos do ente da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.
§ 1o . Os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de
servidores e empregados públicos serão contabilizados como "Outras Despesas de Pessoal".
[...]
Pela disciplina legal, sempre que a contratação de mão de obra pela Administração Pública constituir substituição de servidores e empregados públicos, a despesa dela decorrente deverá ser contabilizada como despesa de pessoal.
Mas em que situações estará caracterizada a “substituição” de servidores ou de empregados públicos, a impor a contabilização da despesa como despesa de pessoal?
Xxxxx, ao tratar da questão, afirma que:
[…] um critério possível a ser adotado quanto ao enfrentamento do fato de estar ou não determinado serviço sendo prestado em substituição a servidor público, consiste em ser identificado - em tese - se caberia à Administração Pública prestar diretamente, por seus próprios meios, dito serviço.(XXXXX, Xxxxxxxx Xxxxxxx. Lei de responsabilidade fiscal e orçamento público municipal. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2007, p. 254)
Conforme dito alhures, a CF, em seu artigo 196 a 199, a par de impor ao Estado o dever de prestar diretamente os serviços de saúde, com primazia, autorizou a complementação da prestação desses serviços pela iniciativa privada, o que, em termos constitucionais, somente pode ocorrer diante da insuficiência dos serviços prestados pelo ente público e da impossibilidade de ampliação da rede própria.
É dizer: o dever de prestar os serviços de saúde compete, primariamente, ao Estado e, somente diante da insuficiência dos serviços por ele prestados e da incapacidade de ampliação da rede própria de atendimento, a complementação da iniciativa privada será autorizada.
Nessa linha de intelecção, a prestação dos serviços de saúde é dever primário do Estado, de forma que, uma vez que seja prestado pela iniciativa privada, para complementar a atuação estatal, dentro ou fora dos limites da autorização constitucional, lícita ou ilicitamente, dar-se-á em substituição à Administração Pública.
Ou seja, no âmbito da prestação dos serviços de saúde, para os fins do artigo 18, §1º,a LRF, não somente a substituição ilícita de servidores públicos por profissionais da iniciativa privada, contratados por credenciamento, constitui despesa de pessoal, mas toda a contratação de mão de obra pela Administração Pública para o exercício da atividade finalistica de prestação de serviços de saúde, de foma complementar, dá-se em substituição à atividade estatal e as despesas dela decorrentes devem ser contabilizadas como despesa de pessoal.
Esse entendimento encontra ressonância nas leis de diretrizes orçamentárias que, no âmbito federal, objetivaram interpretar o disposto no artigo 18, §1º, da LRF, a exemplo da Lei 12.708/2012:
Art. 82. Para fins de apuração da despesa com pessoal, prevista no art. 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal, deverão ser incluídas as despesas relativas à contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos da Lei nº 8.745, de 1993, bem como as despesas com serviços de terceiros quando
caracterizarem substituição de servidores e empregados públicos, observado o disposto no § 3º deste artigo.
§ 1º As despesas relativas à contratação de pessoal por tempo determinado a que se refere o caput, quando caracterizarem substituição de servidores e empregados públicos, deverão ser classificadas no GND 1, salvo disposição em contrário constante de legislação vigente.
§ 2º O disposto no § 1º do art. 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal aplica-se exclusivamente para fins de cálculo do limite da despesa total com pessoal, não se constituindo em despesas classificáveis no GND 1.
§ 3º Não se consideram como substituição de servidores e empregados públicos, para efeito do caput, os contratos de serviços de terceiros relativos a atividades que, simultaneamente:
I - sejam acessórias, instrumentais ou complementares às atribuições legais do órgão ou entidade, na forma prevista em regulamento;
II - não sejam inerentes a categorias funcionais abrangidas pelo quadro de pessoal do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário, ou sejam relativas a cargo ou categoria extintos, total ou parcialmente; e
III - não caracterizem relação direta de emprego.
Segundo a citada disciplina legal, a contrario sensu, consideram-se como substituição de servidores e empregados públicos para os fins do artigo 18, § 1º, da LRF, os contratos de serviços de terceiros relativos a atividades finalísticas do órgão ou entidade (artigo 82, § 3º, inciso I), as atividades-meio (porquanto as atividades-fim já se encontram englobadas no inciso I) que sejam inerentes a categorias funcionais abrangidas pelo quadro de pessoal do órgão ou entidade, exceto aquelas relativas a cargo extintos ou em extinção (artigo 82,
§ 3º, inciso II) e em qualquer tipo de atividade, aquela que caracterize relação direta de emprego (artigo 82, § 3º, inciso III).
Embora tais disposições tenham aplicação apenas no âmbito da União, não há dúvida de que, tendo caráter interpretativo de dispositivo da Lei de Responsabilidade fiscal – esta sim de âmbito nacional – podem servir de orientação para Estados e Municípios.
A mesma orientação extrai-se do Manual de Demonstrativos Fiscais do Ministério da Economia, 9ª edição, 04.00.00 Parte IV, Relatório de Gestão fiscal, 04.01.00 Anexo 1 – Demonstrativo da Despesa com pessoal,
04.01.02 Conceito, 04.01.02.01 Despesa com pessoal, p. 487:
O conceito de despesa com pessoal não depende da natureza do vínculo empregatício. Assim, as despesas com servidores, independentemente do regime de trabalho a que estejam submetidos, integram a despesa total com pessoal e compõem o cálculo do limite de gasto com pessoal. Assim, consideram-se incluídos tanto servidores efetivos, como cargos em comissão, celetistas, empregados públicos e agentes políticos. Esse também é o caso dos agentes comunitários de saúde e dos agentes de combate às endemias, quer tenham sido contratados por meio de processo seletivo público ou não. O conceito de despesa com pessoal também não depende de avaliação jurídica sobre a legalidade ou não da contratação. Assim, tanto as contratações por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público como as que poderão vir a ser contestadas à luz do instituto constitucional do concurso público, por exemplo, deverão ser registradas na despesa com pessoal, independentemente da verificação da legalidade ou validade das contratações, bem como das eventuais cominações que possam advir.(BRASIL. Manual de Demonstrativos Fiscais do Ministério da Economia, 9. ed., 2019, p.487)
Ao discorrer sobre outras despesas com pessoal decorrentes de contrato de terceirização, estabelece o referido manual:
As despesas relativas à mão de obra, constantes dos contratos de terceirização, empregada em atividade- fim da instituição ou inerentes a categorias funcionais abrangidas pelo respectivo plano de cargos e salários do quadro de pessoal, serão classificadas no grupo de despesa 3 – Outras Despesas Correntes, elemento de despesa 34 – Outras Despesas de Pessoal decorrentes de Contratos de Terceirização. Essas despesas devem ser incluídas no cálculo da despesa com pessoal por força do §1º do art. 18 da LRF. O Elemento de Despesa
34 – Outras Despesas de Pessoal decorrentes de Contratos de Terceirização é definido como “Despesas relativas à mão de obra, constantes dos contratos de terceirização, classificáveis no grupo de despesa 3 – Outras Despesas Correntes, em obediência ao disposto no art. 18, § 1º, da Lei Complementar nº 101, de 04/05/2000” “Despesas orçamentárias relativas à mão-de-obra constantes dos contratos de terceirização, de acordo com o art. 18, § 1º, da Lei Complementar nº 101, de 2000, computadas para fins de limites da despesa total com pessoal previstos no art. 19 dessa Lei.”. A LRF não faz referência a toda terceirização, mas apenas àquela que se relaciona à substituição de servidor ou de empregado público. Assim, não são consideradas no bojo das despesas com pessoal as terceirizações que se destinem à execução indireta de atividades que, simultaneamente: a) sejam acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade (atividades meio), na forma de regulamento, tais como: conservação, limpeza, segurança, vigilância, transportes, informática – quando esta não for atividade-fim do órgão ou Entidade – copeiragem, recepção, reprografia, telecomunicações e manutenção de prédios, equipamentos e instalações;
b) não sejam inerentes a categorias funcionais abrangidas por plano de cargos do quadro de pessoal do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário, ou seja, relativas a cargo ou categoria extintos, total ou parcialmente; e c) não caracterizem relação direta de emprego como, por exemplo, estagiários. (BRASIL. Manual de Demonstrativos Fiscais do Ministério da Economia, 9. ed., 2019)
E, sobre as despesas com pessoal decorrentes da contratação de serviços públicos finalísticos de forma indireta, preceitua:
Além da terceirização, que corresponde à transferência de um determinado serviço à outra empresa, existem também as despesas com pessoal decorrentes da contratação, de forma indireta, de serviços públicos relacionados à atividade-fim do ente público, ou seja, por meio da contratação de cooperativas, de consórcios públicos, de organizações da sociedade civil, do serviço de empresas individuais ou de outras formas assemelhadas. A LRF, ao estabelecer um limite para as despesas com pessoal, definiu que uma parcela das receitas do ente público deveria ser direcionada a outras ações e, para evitar que, com a terceirização dos serviços, essa parcela de receitas ficasse comprometida com pessoal, estabeleceu, no § 1º do artigo 18, que os valores dos contratos de terceirização de mão-de-obra que se referem à substituição de servidores e empregados públicos devem ser contabilizados como "Outras Despesas de Pessoal". Da mesma forma, a parcela do pagamento referente à remuneração do pessoal que exerce a atividade-fim do ente público, efetuado em decorrência da contratação de forma indireta, deverá ser incluída no total apurado para verificação dos limites de gastos com pessoal. Ressalta-se que, se os entes da federação comprometem os gastos com pessoal, relacionados à prestação de serviços públicos num percentual acima do limite estabelecido pela LRF, seja de forma direta, mediante contratação de terceirizados ou outras formas de contratação indireta, esses entes terão sua capacidade financeira reduzida para alocar mais recursos em outras despesas. Além disso, se as contratações de forma indireta tiverem o objetivo de ampliar a margem de expansão da despesa com pessoal, poderá ocorrer o comprometimento do equilíbrio intertemporal das finanças públicas, o que poderá inviabilizar a prestação de serviço ao cidadão. (BRASIL. Manual de Demonstrativos Fiscais do Ministério da Economia, 9. ed., 2019)
Dessa forma, se a contratação de profissionais de saúde por credenciamento objetivar atender a uma atividade finalística da Administração Pública, tenha ou natureza complementar nos limites autorizados pela CF, deverão as despesas dela decorrentes ser contabilizadas como despesa de pessoal.
Levando-se em conta tais diretivas legais e regulamentares federais, em conjunto com o que estabelecem os artigos 196, 197 e 199, § 1º, da CF, chega-se à conclusão interpretativa de que haverá substituição de servidores públicos e empregados públicos, para o fim do disposto no artigo 18, § 1º, da LRF, sempre que os contratos de credenciamento, tenham ou não natureza complementar, nos termos delineados pela CF, forem celebrados:
a) para a contratação de profissionais para o exercício de atividades-fim estatais;
b) para o exercício de atividades-meio, quando tais atividades sejam exercidas por categorias funcionais próprias, constantes do plano de cargos do órgão ou entidade (excetuados os cargos extintos ou em extinção);
c) para atividades exercidas de forma que caracterize relação direta de emprego.
Em todas essas hipóteses, independentemente da licitude ou não da contratação, as despesas decorrentes da contratação devem ser contabilizadas como despesas de pessoal, nos termos do artigo 18, § 1º, da LRF.
Esse é, inclusive, o entendimento adotado por outros Tribunais de Contas do país, a exemplo do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que exarou decisão de efeitos gerais, nos seguintes termos:
O Tribunal, de acordo com o voto do Relator, tendo em conta a instrução, decidiu: I. tomar conhecimento das manifestações da então Secretaria de Fazenda e Planejamento contidas nos Ofícios nº 1053/2002- GAB/SEFP, de 24.9.02 (fls. 62/64), e nº 132/2003-
GAB/SEFP, de 18.2.03 (fls. 72/84), considerando-as insuficientes ao cumprimento da diligência determinada pelo item III da Decisão nº 3458/2002; II. relevar o descumprimento do item III da Decisão nº 3458/2002 pela
Secretaria de Fazenda, em virtude de as atribuições do órgão central do sistema de controle interno terem sido transferidas à Corregedoria-Geral do Distrito Federal; III. firmar o entendimento de que: a) o disposto no § 1º do art. 18 da Lei Complementar nº 101, de 2000, aplica-se exclusivamente para fins de cálculo do limite da despesa total com pessoal, independentemente da legalidade ou validade dos contratos; b) não se considera como substituição de servidores e empregados públicos, para efeito do item "a" acima, os contratos de terceirização relativos à execução indireta de atividades que, simultaneamente: b.i) sejam acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituem área de competência legal do órgão ou entidade, na forma de regulamento; b.ii) não sejam inerentes a categorias funcionais abrangidas por plano de cargos do quadro de pessoal do órgão ou entidade, salvo expressa disposição legal em contrário, ou sejam relativas a cargo ou categoria extinto, total ou parcialmente, ou que tenha sua desnecessidade declarada por meio de ato administrativo; b.iii) não caracterizem relação direta de emprego; c) devem ser contabilizadas na rubrica 0.00.00.00.00 (Outras Despesas de Pessoal Decorrentes de Contratos de Terceirização), ou outra que vier a substituí-la, as parcelas dos contratos referentes a contratações de mão de obra para desempenho de atividades relacionadas às atribuições de cargos previstos no quadro de pessoal das unidades integrantes do Complexo Administrativo do Distrito Federal, a exemplo dos e-DOC B011C897 Este arquivo representa documento físico e não o substitui contratos firmados com o Instituto Candango de Solidariedade, ou outros
ajustes que venham a substituí-los; d) devem ser contabilizadas nas rubricas específicas destinadas ao registro de serviços de terceiros as parcelas dos contratos referentes a terceirizações para desempenho de atividades não contempladas nos cargos previstos no quadro de pessoal das unidades integrantes do Complexo Administrativo do Distrito Federal; IV. determinar: a) à Secretaria de Planejamento que, em 60 (sessenta) dias, promova a adequação do orçamento das unidades que realizam dispêndios na rubrica contábil 0.00.00.00.00 (Outras Despesas de Pessoal Decorrentes de Contratos de Terceirização), de forma a possibilitar aos órgãos e entidades distritais proceder aos ajustes contábeis necessários; b) às unidades integrantes do Complexo Administrativo do Distrito Federal que regularizem, no exercício em curso, a contabilização das despesas decorrentes de terceirização de mão-de-obra, em
substituição a servidores e empregados públicos, consoante entendimento firmado no item III; c) à Corregedoria-Geral do Distrito Federal que ofereça aos órgãos e entidades do Poder Executivo distrital a orientação e os instrumentos necessários ao cumprimento dos itens anteriores e passe a incluir nos planejamentos de auditoria a verificação da correta contabilização das despesas enquadráveis no § 1º do art. 18 da LRF, consoante orientações ora emanadas. (Decisão nº 2498/2004. Relator: Conselheiro Xxxxx Xxxxx xx Xxxxx x Xxxxx.)
O Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais também tem decisões, em processos de consultas, que qualificam as despesas de contratos de terceirização de serviços como despesas com pessoal, quando houver a substituição de servidores. Colacionam-se os seguintes julgados:
CONSULTA - DESPESA COM PESSOAL - TERCEIRIZAÇÃO DE MÃO DE OBRA - MÉDICO - CONTABILIZAÇÃO DA DESPESA – EXISTÊNCIA NO QUADRO DE PESSOAL DO ÓRGÃO CONTRATANTE DE CARGO OU EMPREGO COM ATRIBUIÇÕES EQUIVALENTES OU SIMILARES - CÔMPUTO NA RUBRICA "OUTRAS DESPESAS DE PESSOAL" (§ 1º DO
ART. 18 DA LC N. 101/2000). 1) Havendo cargo ou emprego público de caráter efetivo que encerre atribuições correspondentes ou razoavelmente similares às desempenhadas por profissionais ligados a empresas terceirizadas, devem ser os pagamentos correspondentes levados à conta de outras despesas com pessoal, nos termos do disposto no § 1º do art. 18, da Lei Complementar n. 101/2000, devendo ser computados na apuração da despesa total com pessoal dos municípios. 2) Precedentes: Consultas n. 639004, 624786, 638893,
638235, 639681 e 640656. (Processo nº 808104.
Conselheiro Xxxxxxxxx Xxxxxxxx. 17.10.2012).
CONSULTA – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS – TERCEIRIZAÇÃO – ATRIBUIÇÃO A TERCEIROS DE ATIVIDADES-FIM – VEDAÇÃO – TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA – ATRIBUIÇÃO A TERCEIROS DE ATIVIDADES-MEIO – POSSIBILIDADE – TERCEIRIZAÇÃO LÍCITA, DESDE QUE INEXISTENTE NO QUADRO DE PESSOAL CARGO CORRESPONDENTE À ATIVIDADE TERCEIRIZADA –
DESPESA COM TERCEIRIZAÇÃO DE MÃO DE OBRA: INTEGRAM GASTOS COM PESSOAL, SE CARACTERIZADA SUBSTITUIÇÃO DE SERVIDOR – TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA – RESUMO DA TESE
REITERADAMENTE ADOTADA. (...) Integram os gastos com pessoal, para os fins da CR/88 e da LRF, as despesas com terceirização de mão-de-obra para o exercício de atividades que se destinam à substituição de servidores, nos contornos definidos nesta consulta, a despeito de tais contratações serem ilícitas, sem prejuízo das demais searas de responsabilidade (civil, trabalhista, penal etc.). (Processo n° 837660. Conselheiro Xxxxx Xxxxxx. 1º/02/2012).
Não é, entretanto, a direção adotada pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás.
É o que se extrai da IN nº 007/2016 do TCM/GO, que, restringindo o âmbito de aplicação do disposto no artigo 18, § 1º, da Lei de Responsabilidade Fiscal, impõe, em seu artigo 11, § 1º, na redação dada pela IN nº 001/17, a contabilização, como despesa de pessoal, somente das despesas com credenciamentos de profissionais de saúde para suprimento de vagas limitadas, no exercício de atividades com jornada específica, realizados como alternativa à impossibilidade de provimento de cargos por meio de concurso público e nas hipóteses em que o credenciamento configurar terceirização ilícita ou fraude ao concurso público (artigo 12 da IN 007/2016 TCM/GO).
Essa restrição à contabilização de despesas decorrentes de contratos de credenciamento como despesas de pessoal, além de violar o disposto no artigo 18, § 1º, da LRF, amplia a margem de expansão da despesa com pessoal, inclusive em áreas não essenciais, com comprometimento do equilíbrio intertemporal das finanças públicas, o que poderá inviabilizar a prestação de serviços essenciais ao cidadão.
Dessa forma, cabível a intervenção do Ministério Público do Estado de Goiás para obter um provimento jurisdicional que imponha aos Municípios (e também ao Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás) a obrigação de contabilizar como despesa de pessoal todas as despesas decorrentes de contratos de credenciamento que constituam “substituição de servidores e empregados públicos”, assim compreendida toda contratação de profissionais de saúde para o exercício de atividades-fim do ente público, atividades-meio que sejam exercidas por categorias funcionais próprias, constantes do plano de cargos do órgão ou entidade (excetuados os cargos extintos ou em extinção) e para atividades exercidas de forma que caracterize relação direta de emprego, conforme estabelece o artigo 18, § 1º, da LRF.
Necessário consignar que, diante da situação atual de emergência de saúde de importância nacional e internacional, reconhecida pelo Ministério da Saúde por meio da Portaria 188/2020, já foi declarada, pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, a situação de calamidade pública de vários Municípios goianos, o que, nos termos do artigo 65 da LRF, imporá a suspensão dos prazos para a adequação da despesa com pessoal, previstos no artigo 23 da referida lei.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, pode-se chegar às seguintes conclusões sobre
o tema:
➢ O serviço de saúde é dever do Estado e, prestado diretamente pelo SUS, pressupõe o vínculo efetivo dos profissionais de saúde com o poder público, mediante concurso público;
➢ A participação da iniciativa privada no SUS é admitida em caráter complementar, desde que evidenciada a insuficiência da rede própria do ente público e a impossibilidade de sua ampliação;
➢ Admite-se, em caráter complementar, a contratação de serviços de saúde, por credenciamento, com clínicas, laboratórios, hospitais e serviços médico-hospitalares particulares, à escolha do paciente, com remuneração correspondente ao serviço prestado, que terá como referência a Tabela de Procedimentos do SUS;
➢ Admite-se, excepcionalmente, o credenciamento de profissionais de saúde para o exercício de atividade-fim, em substituição a profissionais contratados por concurso público, nas condições previstas do art. 3o, § 3o, da IN nº 007/16 do TCM/GO, desde que seja comprovadamente inviável a admissão dos profissionais por concurso público e desde que não haja possibilidade de exclusão de concorrentes;
➢ O credenciamento é um contrato administrativo celebrado de forma direta, por inexigibilidade de licitação (art. 25, caput, Lei nº 8666/93), para atuação não-exclusiva, sem competição entre os possíveis contratados, com o fim de complementar os serviços públicos de saúde (arts. 197 e 199, § 1º, CF), nas situações em que os serviços de saúde da rede pública forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial necessária e não puder o ente público ampliar os serviços da rede;
➢ Admite-se, excepcionalmente, o credenciamento de cooperativas de profissionais de saúde, para o exercício de
atividade-fim, desde que o serviço não demande subordinação entre a cooperativa e os cooperados, nem entre a Administração e os cooperados, observadas as restrições do art. 5o da IN nº 007/16 do TCM/GO, bem como o disposto no artigo 199, § 1º, da CF;
➢ A remuneração dos credenciados deve se dar na forma de contrapartida, por procedimento ou unidade de serviço, conforme estabelecido em edital e no contrato e, em princípio, os valores deverão atender aos parâmetros fixados pelo SUS. Entretanto, é possível que o Município estabeleça preços acima dos mínimos, tendo em conta características locais e o objetivo de atrair um número maior de profissionais, observados os princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, as circunstâncias locais e as disponibilidades financeiras, devendo tais despesas ser custeadas com recursos próprios do Município. Em qualquer caso, os valores pagos deverão observar o teto remuneratório local, estabelecido na CF e os limites com despesas de pessoal, previstos na LRF.
➢ O servidor efetivo da área de saúde não pode firmar contrato de credenciamento com o mesmo ente público contratante (art. 9º, III, da Lei nº 8666/93), seja como pessoa física, seja como prestador de serviços por cooperativa ou outra pessoa jurídica;
➢ Independentemente da licitude ou não da contratação, toda despesa decorrente da contratação de mão de obra que caracterize “substituição”, de servidores e empregados públicos, por contratos de credenciamento deve ser contabilizada como despesa de pessoal, nos termos do artigo 18, § 1º, da LRF;
➢ Haverá “substituição” de servidores e empregados públicos, para o fim do disposto no artigo 18, § 1º, da LRF, sempre que os contratos de credenciamento, tenham ou não natureza
complementar, nos termos delineados pela CF, forem celebrados para o exercício de atividades-fim estatais ou para o exercício de atividades-meio, quando tais atividades sejam exercidas por categorias funcionais próprias, constantes do plano de cargos do órgão ou entidade (excetuados os cargos extintos ou em extinção), ou exercidas de forma que caracterize relação direta de emprego.
Essas são apenas algumas diretrizes para a atuação, diante das irregularidades mais comuns verificadas nas contratações de profissionais de saúde, de forma precária, inclusive por credenciamento.
As especificidades do caso concreto, entretanto, podem recomendar outras análises, razão pela qual, desde já, reitera-se a integral disponibilidade desta Área de Atuação para complementações que porventura sejam necessárias.
Goiânia, 22 de abril de 2020.
Xxxxxxx Xxxxx Zamalloa do Prado
Promotora de Justiça Centro de Apoio Operacional
Coordenadora da Área do Patrimônio Público e Terceiro Setor